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sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Socorro (reflexões em torno de uma palavra)

(Imagem daqui)

So-co-rro!

Palavra tão silabada,

tão difícil de soltar.

Tão perra,

tão demorada

quando o horror

nos transtorna

e é preciso gritar.

Prende-se logo a voz

na consoante, um sibilo.

Escapa um silvo hesitante,

sem consistência, enfezado,

quando aquilo que se exige

é um som acutilante.

Tenta-se engrossar o “co”,

Mas é mudo este o.

Fica preso, sem sentido,

é discreto, comedido,

ineficaz por si só.

Resta-nos o “rro” final.

Começa bem, rola forte

mas sendo o som terminal,

tão fraco como o anterior,

morre, pois não tem suporte.


Socorro, palavra oca,

dita sempre com amargor,

é algo que nos sufoca

É um brado imolador.

Donagata em 2008/08/07

Jogo de palavras inspirado numa frase de Mia Couto do livro que estou a ler no momento “Venenos de Deus, Remédios do Diabo” “…a própria palavra “socorro!” lhe parecia demasiado silabada para ser gritada, mesmo em súbita e suprema aflição.”

3 comentários:

Anónimo disse...

Olá!

Venho agradecer a visita às minhas Horas Serenas!

Já li este livro... como todos os escritos por este autor - fantástico!

Também vou voltar, com certeza!!
Bjs

Mar Arável disse...

Belo exercício

uma construção de palavras

onde se pode respirar

em todas as varandas

Anónimo disse...

É exactamente assim. Apetece fritar mas fica presa nos próprios sons. Gostei muito.