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domingo, 27 de novembro de 2011

As palavras


As palavras escapam-se-me magras e vazias

numa tentativa frustrada de iludir o vazio de mim.

Palavras castanhas, cinzentas, algumas ainda roxas,

às quais subtraio o sentido, o som, o calor, a luz, o cheiro…

Palavras que tomo de empréstimo mas que não enlaço,

que não toco, que não me tocam, que não sinto minhas…

Palavras desabitadas apenas…

Apenas palavras.

domingo, 6 de novembro de 2011

E há o natal!


E há o natal!
E as luzes, as cores, o frio
e a música, as luzes, as fitas e o frio
e os embrulhos, a ansiedade, o frio, os cheiros, e as vozes,  
as luzes, os fritos, o pinheiro e os cheiros e o medo
e o frio, os anjos, as vozes, o azevinho, o nascimento
os irmãos, e os sobrinhos e os cheiros, a incerteza, a música,
o pinheiro e as bolinhas, o frio, os sininhos, a lareira,
as vozes, os pastorinhos, a saudade…  e a magia,
a ansiedade e a música e eu e tu e tantos …  
afinal,  não tantos… 
e o natal!

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

“Ilha Teresa” de Richard Zimler



Mais um livro deste autor que li quase de um fôlego só.
Completamente diferente dos seus livros de pendor histórico, como é o caso de todos os que descrevem a saga da família Zarco, dos quais, aliás, sou apreciadora indefectível, surpreende-nos exactamente por essa diferença e pela forma excelente como Zimler se movimenta num registo bastante distinto. Interessantíssimo!
Não lhe encontrei também semelhanças substantivas com “Trevas de Luz”, “À Procura de Sana” ou “Confundir a Cidade com o Mar”.

Neste livro o autor aborda temas actuais, difíceis, penosos e delicados, com leveza e sensibilidade, sem contudo deixar transparecer qualquer laivo de superficialidade no seu tratamento.
É, por exemplo, o caso da inadaptação social devida ao facto de se ser diferente numa escola, numa sociedade, num país. E todos nós sabemos quanto essa diferença é difícil de gerir e quão esmagadores podem ser o sofrimento e a exclusão que essa inadaptação acarreta, sobretudo se tivermos em conta que estamos a falar de jovens.

Teresa é uma adolescente de quinze anos, portuguesa, de Lisboa, que se vê de um momento para o outro a viver nos subúrbios de Nova Iorque com o seu pai, a sua mãe e um irmão. É uma rapariga inteligente, sensível e, certamente também muito devido a essas características, desajustada e presa num mundo só seu, na sua “ilha”.
E sofre. Sofre por ela, pelo irmão, pelo desmazelo da mãe, pela perda do pai e.. por amor.
Tem um único amigo, Angel, um brasileiro de dezasseis anos, também ele diferente, também ele vítima de preconceitos, também ele marginalizado e excluído.
Ambos gostam de John Lennon que é para Angel um ícone incontornável. Ambos decidem ir “em peregrinação” ao Memorial Strawberry Fields Forever, em Central Park, no dia em que se recorda o assassinato do ex- Beatle, 8 de Dezembro (de 2008). E será este o dia que determinará a grande mudança nas suas vidas.

Zimler adopta um tipo de linguagem peculiar mas inteiramente adequado à sua personagem narradora. Fluente, claro, ligeiro, jovem e muito, muito irónico. Teresa é possuidora de um sentido de humor inteligente e cáustico. Dá a ideia, às vezes, de ironizar para tapar as lágrimas. Quem sabe?
Quem, como eu, está familiarizado com a escrita de Zimler encontrará aqui uma outra forma de expressão literária que não desmerece em nada a habitual, É sim um exemplo da sua capacidade de ajustar o discurso escrito às necessidades mantendo a sua individualidade e as características específicas da sua escrita. Em suma, o seu estilo.

O enredo é desenvolvido de forma descomplicada e agradável. Não é exageradamente directo, o que poderia retirar ao leitor a sua participação na construção da história, sem contudo ser exaustivo e redundante nas explicações que dá não correndo assim o risco de ser enfadonho. Está, na minha opinião, na medida certa.
Prende irremediavelmente o leitor desde o início. Aliás, este é levado, pela mão de Teresa, a percorrer anseios, inquietações, a sofrer, a amar, a perder, a caminhar nas dúvidas, a afundar-se e a regressar à superfície tal como sucede com a personagem (as personagens). 
Teresa uma adolescente isolada, em ruptura com o mundo mas que é, no fundo, uma mulher forte, de garra, como tantas outras personagens mulheres que Richard Zimler tem construído.

Mais um livro a não perder. Se ainda não o leram, não tardem. Vale a pena. 

A ler também aqui, no número 3 da Revista-Me, com uma breve entrevista ao autor.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

De António Nobre



Dizendo um pequeno excerto de "Viagens na minha Terra" de António Nobre da obra "Só" muito bem acompanhada pelo Pedro Lopes ao piano e pelo Miguel Motta na voz.


Nota importante:

Porque percebi que algumas dúvidas se colocaram nos espíritos dos mais atentos, cumpre-me informar que não, não me encontrava ajoelhada... O Miguel é que é mesmo assim, daquele tamanho.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A gata branca

Era uma gata belíssima aquela que me apareceu no caminho logo no primeiro dia em que, da área da piscina, me dirigia ao meu quarto.

Estranhei a sua magreza. Contudo mantinha um porte altivo, uns olhos brilhantes que pediam algo. Dirigi-me a ela com palavras doces mas a gata branca, imaculadamente branca, embora não fugisse, não confiava. Ia-se aproximando mantendo bem alerta todas as suas defesas. E o seu olhar pedia algo. Fui ficando por ali conversando com ela, sentada no chão, numa tentativa de me aproximar. Gostaria de a acariciar. Não consegui.

Quando estávamos apenas as duas, entendi o desespero daqueles olhos. De sob o passadiço de madeira onde ambas nos encontrávamos, começaram a surgir, se bem que muito desconfiados e sempre prontos a esconderem-se, seis lindos gatinhos pequeninos. Os seus filhos! Eram ainda mais pequenos do que a provável idade lhes imporia pois estavam, também eles, magríssimos.

Fui buscar uma tosta mista que tinha pedido para o almoço e, partindo-a aos bocadinhos pequenos, deixei-lha para que comessem. Devoraram-na sofregamente sob os olhares atentos daquela gata branca que apenas comia aqueles que lhe colocava na sua frente e não os que lançava para junto dos filhos, um pouco mais longe.

Era uma cena de ternura aquela que eu presenciava se bem que embrulhada numa enorme nuvem de tristeza.

Sempre que pressentiam alguém os pequeninos escondiam-se assustados e a mãe, embora não fugisse, sempre elegante e altiva, deslumbrante na sua brancura, mantinha uma distância segura de quem passava.

Tive que ir. Não queria passar o meu primeiro dia de férias sentada num passadiço de madeira a olhar para algo que me arrefecia o ânimo.

Não sabia qual a política do hotel em relação à permanência de animais nos seus vastíssimos espaços exteriores, mas a magreza e o temor revelado por aqueles sete animais não prenunciava nada de bom.

O melhor seria mesmo manter silêncio acerca deles.

sábado, 3 de setembro de 2011

Crónica de uma saudade anunciada


Primeiro foram aqueles tempos sem tempo em que os dias passavam por mim (ou seria eu que passava por eles?) sem que, verdadeiramente, as horas se distinguissem. Tempos em que as horas me prendiam e se enredavam e me enredavam, e me atrapalhavam, e se confundiam e já nem eram horas de tão enredadas…

Além disso havia aquela névoa familiarmente estranha que me turvava o pensamento, o sentir, impelindo-os para dentro, sempre para mais adentro, ali bem para aquele local onde se arquitectam todas as mágoas.

Seguiram-se tempos de incertezas: Aquilo que hoje era, amanhã era-o também apenas com um subtil aroma de dúvida. Tudo que hoje mais queria, amanhã já não desejava, tinha-lhe até medo. Todas as emoções que hoje me ardiam se quedavam extintas no mais logo do amanhã.

E assim se foram desenrolando uns tantos hojes e ontens ainda recentes, nos quais se sonhavam os já saudosos amanhãs.

Finalmente as certezas. Irias partir! Irias perseguir o teu futuro bem presa na força da tua vontade. Irias voar nas asas da tua coragem. E viverias outros ontens, outros hojes e sonharias outros amanhãs que não aqueles que eu costumava partilhar contigo.

Mesmo assim, mesmo presa nas escamas da saudade, estarei orgulhosamente, hoje, a torcer para que todos os teus amanhãs sejam tudo aquilo que de mais belo imaginaste.

Por vezes amar dói tanto!

Nova Iorque, 18 de Julho de 2011

domingo, 21 de agosto de 2011

“A Morte de Carlos Gardel” de António Lobo Antunes


Decidi ler agora (Fevereiro deste ano) este livro de Lobo Antunes, um dos muitos que ainda não li, pelo facto de ter sabido, há já uns tempos atrás, estava o argumento ainda em fase de preparação, que a realizadora sueca Solveig Nordlund iria realizar um filme não só homónimo do livro como tendo por base a sua história.

Ora, sem dúvida, tal conhecimento espicaçou-me a curiosidade em relação ao livro. E agora, confesso, tenho a curiosidade ainda mais encarniçada para ver o resultado final. Neste caso, do filme.

E então o livro:

É mais um livro com a marca inconfundível de António Lobo Antunes. Um livro em que a narrativa se encontra fraccionada, surgindo sem sequência temporal ou espacial, intercalando tempos, espaços, acontecimentos (reais ou do mundo imaginário), e personagens.

Encontra-se dividido em cinco partes sendo que cada uma delas tem por título um tango de Carlos Gardel. Começa com “por una cabeza”, vai seguindo com a “milonga sentimental”, passa para a “lejana terra mia”, até “el dia que me quieras” para terminar com a belíssima “melodia de arrabal”.

Devo dizer que fui ouvir estes tangos (um prazer, gosto de tango, confesso) procurando ver se havia alguma ligação entre as suas letras e o que ocorria naquelas, também cinco, falas. E, realmente, penso que posso com facilidade estabelecer algumas ligações entre os sentidos dos textos. Ou então será mera vontade minha de o fazer. Deixo ao critério, ou à imaginação de cada leitor encontrar, ou não, essa intertextualidade, essa coincidência de sentidos.

Cada uma dessas partes está dividida em, chamemos-lhe capítulos, em que é dada voz a uma personagem. Uma estrutura também já habitual em alguns dos livros de ALA.

E é ao seguirmos essas vozes de cada um que se vai desenrolando perante nós uma história que é, no fundo, o somatório de muitas e, todas elas, gestas tristes onde a desesperança, o isolamento, a insegurança, o desamor, um passado de desilusões são denominadores comuns a todas as personagens.

Nuno, o filho toxicodependente de Álvaro e de Cláudia, encontra-se internado em estado terminal (acabando por morrer). À sua volta vamos encontrando os familiares e relativos que vão soltando as suas existências, os seus pensamentos, as suas fantasias traçando-nos, com elas, um quadro tremendamente deprimente em que a iminente morte do Nuno acaba por se ir diluindo no dramatismo acabrunhante de todas aquelas vidas.

Temos a Cláudia, mãe do Nuno, abandonada por Álvaro que lhe diz que não gosta dela, que nunca gostou, e que, depois de outras, acaba por manter uma relação com um indivíduo da idade do filho.

Graça, tia de Nuno, irmã de Álvaro, com uma relação homossexual assumida com Cristiana, que apenas suporta, pois, na verdade, por quem sempre esteve apaixonada foi pelo irmão.

Cristiana, insegura e exigente. Tremendamente infeliz.

Raquel, a actual esposa de Álvaro, socialmente muito diferente deste, a qual ele não aguenta e não se coíbe de o demonstrar…

E Nuno que, de facto, nunca esteve verdadeiramente ligado a ninguém.

Álvaro é apaixonado pela música de Carlos Gardel que ouve repetidamente. Esta obsessão vai piorar e entrar num caminho sem retorno no dia em que encontra o Sr. Seixas, um velho que, com a sua mulher (agora imobilizada por uma trombose), se apresentava em bares de categoria cada vez mais duvidosa, imitando a imagem e o cantar de Carlos Gardel e dançando os seus tangos. E seguindo-o, lidando com ele como se do verdadeiro Gardel se tratasse, negando a morte deste, Álvaro procura prolongar o mito. Quiçá o único ao qual se sente ainda ligado, o único fio de ilusão que ainda lhe resta.

Mas, na verdade, nem isso ele consegue…

Como sempre a escrita de ALA encanta-me pela perfeição que nela se acha. Todas as palavras estão ali mesmo, onde deviam estar.

E a poesia que dela emana!!!!


Nota:

Não sei por que raios é que não consigo colocar este post sem retirar a cor de fundo da página. Mas desisto. Depois de 1900 tentativas vai mesmo assim. Pronto.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

“Quantas Madrugadas tem a Noite” de Ondjaki

Este foi outro dos livros que ainda li em Nova Iorque. Este não foi propriamente um lenitivo. Foi, sem dúvida, um desafio.

Livro muito interessante mas apenas depois de lhe conseguir encontrar o ritmo. E este é um caso que constitui um verdadeiro desafio.

Escrito numa linguagem muito oral, completamente coloquial utiliza, além de palavras mal pronunciadas, léxico muito específico, com uma enorme profusão de termos próprios de uma linguagem africana, o que, para quem não está familiarizado com esse tipo de linguagem (como é o meu caso), torna algumas partes da narrativa quase ininteligíveis ou, pelo menos, muito maçadoras de ler dada a quantidade de consultas ao glossário que é necessário fazer.

Ultrapassado este primeiro obstáculo (para quem tiver vontade de o fazer), um pouco mais familiarizados com alguns termos que se repetem e adivinhando o sentido de outros, acabamos por encontrar uma história magnífica recheada de personagens que têm tanto de ricas e genuínas como de pitorescas e até caricatas.

Aqui podemos encontrar o anão BurkinaFaçam, um homem bom, que vive de expedientes vários e que tem a permanente companhia de duas prostitutas. O Jaí, albino de condição, professor e honesto até à medula de vocação. O AdolFodido, o defunto, herói de uma guerra que nunca poderia ter protagonizado. As suas duas viúvas. A KotadasAbelhas que se substituiu à abelha-mestra de uma colmeia depois de a matar. E o cão, o enigmático cão…

À medida que o narrador, em troca de umas cervejas (birras) vai desenrolando as fascinantes peripécias em que estas (e outras) personagens se vêem envolvidas, temos que admitir que estamos perante, não só uma capacidade imaginativa invulgar como também de uma, não menos invulgar, capacidade de escrita. É muito difícil escrever num registo coloquial sem que o resultado se ressinta no que diz respeito à qualidade literária. Tal não acontece neste caso.

Confesso que tiro muito mais prazer da leitura do, chamemos-lhe, português padrão quando bem escrito. Dado que não exige de mim nenhum esforço adicional permite-me, sem ruídos de qualquer espécie, concentrar-me no enredo e degustá-lo desde o início.

Contudo, e para ser completamente honesta, apesar das dificuldades iniciais, acabei por gostar muito do que li.

Recomendo. A leitura bem como a paciência para ultrapassar os primeiros desânimos.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

“A Varanda do Frangipani” de Mia Couto

Um dos poucos livros que levei na minha curta viagem a Nova Iorque e um verdadeiro lenitivo para os momentos menos agradáveis que lá passei.

Pois bem. É um livro lindíssimo. E quando digo lindíssimo não exagero nem um pouco. A sua escrita é um verdadeiro poema pela sua beleza, pela sua singeleza, pela sua candura.

Com um toque de policial, com muito de despojo físico e moral de uma guerra terminada há tão pouco tempo, é uma história repleta de histórias magníficas extraordinariamente bem contadas.

Ermelindo Mucanga, falecido mas sem ter tido um enterro condigno, de acordo com os costumes do seu povo, para fugir à “maldição” de ser considerado herói, dispõe-se a reencarnar para voltar a morrer. A sua alma volta à vida no corpo de Izidine Naíta o inspector que vai à Fortaleza de S. Nicolau (actualmente um asilo) com o objectivo de desvendar o mistério da morte de Vasco Excelência director do referido asilo.

Aí, Izidine Naíta é confrontado com as narrativas mais incríveis dos velhos residentes. Narrativas fantásticas em que o folclore moçambicano, as diversas crenças, os mitos, revivem e adquirem corpo em cada página de uma forma muito vívida se bem que também muito natural.

Por norma gosto da escrita de Mia Couto. Mas este livro, confesso, arrebatou-me pela sua beleza e pela ternura com que se lê.

Aconselho vivamente

sábado, 13 de agosto de 2011

Vazio


Mais um sopro desatado de dolência.

Mais uma mancha que se estende

e me agasalha de cinza

o desarrumo que é a minha alma.

Mais um vazio que me preenche,

que me esvazia,

que me afoga as pestanas na tristeza,

da ausência de ti.

2011-07-27

quinta-feira, 14 de julho de 2011

“A Biblioteca das Sombras” de Mikkel Birkegaard

Como já disse diversas vezes sou uma leitora bastante compulsiva de todos os géneros literários. Contudo, como é natural, há géneros que me suscitam mais curiosidade do que outros. Pois bem, gosto de ler um bom policial.

Quando li a sinopse deste”Biblioteca das Sombras” fiquei logo entusiasmadíssima.

Senão vejamos; Um livro inteiro sobre livros, livrarias, bibliotecas e bibliófilos (já promete!). Tudo isto embrulhando uma morte que se verifica ter sido um assassinato peculiar e que leva o filho do assassinado a encetar uma investigação que o arrastará por caminhos misteriosos…

Pois, não podia deixar de ler.

O livro começou a interessar-me logo às primeiras páginas. Luca Campelli o dono da prestigiada livraria “Libri di Luca” em pleno centro de Copenhaga, chega de uma viagem que o manteve ausente da sua adorada livraria por mais de uma semana.

Ao chegar, inala o odor dos seus adorados livros, serve-se de um cognac e dirige-se ao mezanino, local onde se encontram os exemplares mais ricos e mais invulgares da sua livraria a que muito poucos têm acesso dado o seu valor. Aí repara num exemplar que estranha e começa a lê-lo. À medida que se embrenha na leitura vamos acompanhando estranhos fenómenos ligados ao comportamento de Luca que culminam com o derrube da balaustrada do mezanino e consequente queda que lhe provoca a morte. Este processo de leitura e seus efeitos, embora não totalmente compreensível, ainda, para o leitor, está muito bem descrito e é deveras envolvente.

É que Luca, sabê-lo-emos entretanto, fazia parte de uma sociedade secreta, os Lectores, possuidores de dons excepcionais de leitura que lhes permitiam arrebatar o leitor levando-o a ler o que quisessem que lesse. Mais propriamente a enfatizar os aspectos da leitura que quisessem. Ora esse poder, como facilmente inferiremos, tem tanto de admirável como de perigoso.

Jon, filho de Luca e proeminente advogado, é, no rescaldo da morte do pai, apanhado no meio de todos estes mistérios e perigos que desconhecia completamente mas que tem de enfrentar para salvar a própria vida.

Claro que há espaço para o romance o qual acontece entre Katherina e Jon.

Com todos estes ingredientes e um começo interessante é certo que criei as minhas próprias expectativas que, infelizmente, acabaram por não corresponder à realidade.

O que acabei por ler foi um romance ao estilo Dan Brown, com muito ritmo mas pouca história. E, sobretudo, pouca consistência. Tudo, na minha opinião, é aflorado um tanto superficialmente. As personagens são pouco sólidas à excepção de Katherina que achei bem trabalhada e credível.

Também os sucessivos desfechos do enredo foram, para mim, demasiado previsíveis. Quase desde o início que foi evidente quem eram os “maus” e os “bons” da fita; quase desde início que soube quem eram os traidores e as consequentes vítimas. Enfim, quase desde o início que pude construir a história sem grandes desvios em relação ao que realmente aconteceu.

E para terminar… o fim. Pois, o fim , boring…. Um verdadeiro desconsolo.

Com tudo o que acabei de vos dizer e vale o que vale, é apenas a minha opinião, estamos em presença de um best seller…

Dizer que perdi tempo com a leitura do livro? Não posso, nunca considero uma leitura uma verdadeira perda de tempo. Além disso estamos em presença de uma escrita fluida, agradável, sem grandes pretensões literárias mas agradável mesmo assim.

Um livro a ler para quem gosta do género mas, continuo a achar, com muito pouca substância…

quarta-feira, 13 de julho de 2011

“Jesusalém” de Mia Couto

Finalmente chegou a vez de ler este livro que há já algum tempo se perfilava num dos vários “montinhos” que tenho por ler(des)organizados à minha maneira. É certo, também, que embora tenham um lugar nessas “listas de espera” físicas (espalhadas por prateleiras, cestos, malas ou apenas empilhados no chão do escritório), a batota que faço é mais do que muita…

Enfim, em detrimento de outros que esperavam há mais tempo, acabou por ser este o seleccionado para ler pois era grande a curiosidade. É que embora não seja uma leitora muito assídua do autor, a verdade é que tenho gostado bastante daquilo que li. É o caso de “Venenos de Deus, Remédios do Diabo”, “A varanda do Frangipani” e, julgo que apenas mais o “Último Voo do Flamingo” e primeiro que li do autor.

Mas regressemos a este “Jesusalém”.

Jesusalém é uma terra há muito esquecida que vai ser agora reabitada e renomada por Silvestre Vitalício. Este, com os seus dois filhos, o seu cunhado, o Tio Aproximado e Zacaria Kalash, o guerreiro que sempre militou nas causas erradas, escolhe-a para se instalar quando foge da cidade exactamente pelo seu isolamento e esquecimento.

É lá, construindo um mundo apenas seu, que Silvestre Vitalício se esconde da vida com o intuito de fugir às recordações da morte. É também lá que Ntunzi sofre a ausência do mundo que era o seu e de onde foi arrancado e que Mwanito, o nosso narrador, se converte no afinador de silêncios.

Do Lado-de-Lá tudo se havia extinguido, até as almas penadas. Em Jesusalém tudo eram vivos. Sem saudade ou esperança mas vivos.

É uma história de homens em que a mulher é o detonador e a razão de todos os acontecimentos.

É uma subtil (ou não) história de amor e de amores. Mas também uma história de dor, de rumorosos silêncios, das muitas mortes de uma vida.

Se a história é lindíssima e nos transporta a uma terra sem passado e em que o presente e o futuro se desenham em torno da vontade de um, terra onde um dia Deus virá pedir desculpa, e Jesus se descrucificará, a linguagem que a desenvolve é belíssima. Mia Couto consegue juntar à candura da narrativa de uma criança, ou das falas das gentes do interior moçambicano, a poesia complexa das coisas simples.

O resultado é muito bom.

Nota: Só para que conste; o livro é bom. Tão bom que despertou a cobiça de alguém que se apropriou indevidamente dele e o levou de cima de uma arca frigorífica de um pequeno mercadinho onde o havia pousado enquanto escolhia umas cerejas brilhantes e carnudas que, da montra, chamaram por mim.

Realmente eram boas, as cerejas, mas lá que ficaram caras, também é um facto. É que me custaram o preço delas mais o de outro exemplar do livro pois fiquei irritada e impaciente a escassas 17 páginas do final.

Ao menos que quem o levou se console com a sua leitura…. Eu consolei-me, com ele e com as cerejas.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Deslizando

(escultura de Camille Claudel)

Caminho com mil cautelas.

Silêncio ante silêncio, cuidado ante cuidado,

apenas para te não acordar.

E com jeitinho, rotina ante rotina,

vou deslizando, sacudindo vésperas

de um dia que quer começar.

E de ti… apenas a tua ausência

para me embalar.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

terça-feira, 28 de junho de 2011

Noite de Poemia no Labirinto


Mais uma Noite de Poemia, no Labirintho, a não perder!


No Labirintho, a "Noite de Poemia" da próxima quarta-feira, dia 29, horas, terá em destaque a apresentação poética do livro "O Céu sobre Berlin", de Danyel Guerra.

Durante a sessão, que se inicia às 22h00, serão lidos, por Celeste Pereira e José Carlos Tinoco, trechos da obra e poemas de Sophia de Mello, Ana Cristina César, Hilda Hilst, João Cabral de Melo Neto, Jorge Luís Borges, Olavo Bilac e Danyel Guerra.

Em "O Céu sobre Berlin", Danyel Guerra evoca o derrube do Muro de Berlin, sensações e perplexidades expressas numcroniconto fantasista, misturando uma realidade pungente com uma fabulação luminosa. O livro integra ainda mais nove "estórias de estrada", crónicas encenadas nas cidades espanholas de Bilbao, San Sebastián, Vitoria, Getaria, Barcelona, Oviedo e La Manga del Mar Menor. E ainda uma ode pícara, inspirada na obra da escritora Hilda Hilst.

No final do evento, Danyel Guerra estará disponível para uma sessão de autógrafos de "O Céu sobre Berlin".

domingo, 26 de junho de 2011

“Auto dos Danados” de António Lobo Antunes

Mais um livro de ALA que ainda não havia lido. E mais uma leitura interessante e estimulante como já me habituaram as leituras dos muitos outros livros que li do autor.

Este passa-se no ano de 1975. Ano conturbado em termos sociais e políticos, ainda no rescaldo do 25 de Abril.

Fala-nos de uma família decadente, de antigos latifundiários, algures no Alentejo. Família onde reinam o desamor, a ganância, o rancor, a raiva, a cobiça entre os seus elementos. Uma família completamente disfuncional (não é novidade nos livros de ALA) em que os elementos que a constituem se encontram ligados por sentimentos sórdidos que os empurram uns contra os outros mas que, ao mesmo tempo, os impelem uns para os outros prendendo-os numa teia dificilmente compreensível. Pelo menos dificilmente explicável.

Embora a história vá sendo narrada em diferentes tempos e por diferentes personagens dando, de cada uma, o seu ponto de vista de uma mesma realidade, esta passa-se, como já disse, no ano de 1975 durante a agonia e morte do chefe do clã, Diogo.

Diogo, o patriarca duro, prepotente, violento, mulherengo, licencioso, distante, está prostrado, agonizante, no leito de morte enquanto os seus sucessores de digladiam surdamente na mesma casa. A filha e o genro procuram afanosa e desrespeitosamente o testamento, numa tentativa de espoliar os outros membros dos respectivos direitos sucessórios. Tudo isto enquanto a festa da localidade prossegue com os foguetes, a música, as vendas de rua e…a morte do touro pela populaça. Este acontecimento, o auge da festa, altura em que todo o povo se encontra inebriado pelo sangue e pela crueldade gratuita, é também o fim do velho morgado.

Com uma escrita intensa sobretudo sob o ponto de vista de riqueza psicológica das personagens, ALA vai-nos conduzindo através dos sentires de todas as personagens, mas também dos seus mais recônditos podres, dando-nos os instrumentos para compormos o retrato desta família que, sem dúvida, será o retrato muito próximo de tantas famílias burguesas dessa época em que as mudanças sociais se davam com extrema rapidez e a burguesia se sentiu acossada e amedrontada pelo proletariado e campesinato em ascensão.

Não é um livro de leitura linear. Não o são os livros de Lobo Antunes. Não tem como característica, todos sabemos, facilitar a vida ao leitor. Contudo, apesar de não haver sequência temporal nem factual nas diegeses feitas pelos diferentes narradores (neste livro o autor demite-se do papel simultâneo de narrador), não é dos livros mais trabalhosos de ler.

Recomendo.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Hoje não há tripas no Rivoli!!!!


- Oh Sr. Siva, Sr. Silva!!!! Largue-me as orelhas, carago, que ainda mas arranca!!! Assim gritava o pobre Joaquim, aprendiz de cozinheiro, enquanto o Chefe Andrade, com ganas nunca imaginadas, lhe puxava, torcia e rolava os apêndices auditivos, já de tamanho considerável mesmo sem estas inesperadas ajudas. E, enquanto ia puxando, torcendo e rolando vociferava cada vez mais encarniçado, lançando impropérios ao rapaz e a toda a sua família (sobretudo à mãe, a D. Adozinda , por acaso senhora de muito respeito). Enquanto isso, ia ainda tecendo conjecturas acerca de todos os acessórios que gostaria ainda de lhe arrancar além das já citadas orelhas.

Mas vamos lá ver a que se deve tamanho rebuliço na normalmente calma cozinha do Chefe Andrade.

Pois bem, era sexta-feira, 10, do mês de Junho, dia programado para a tão badalada e esperada abertura do restaurante do Café-Teatro Rivoli. Ora, como se trata de um ícone portuense nada melhor para constar no cardápio, com honras de prato principal, do que umas tripinhas à moda do Porto. Iguaria que desde os tempos em que as donas de casa, desesperadas com a falta de carne que haviam enviado para os marinheiros que se faziam a Ceuta, se tinham agarrado às miudezas, se tornou de comer e chorar por mais. É verdade. Sempre criativas estas gentes do norte. Ainda por cima num dia tão importante como o “Dia de Portugal”… Há lá coisa mais portuguesa do que umas tripas à moda do Porto????

- E estava tudo a correr tão bem!!!! Gemia o Sr. Andrade, agora sem pose de chefe, abatido e desgostoso, enquanto o Joaquim o olhava de uma distância segura e com a grande mesa da cozinha de premeio não fosse o diabo tecê-las…

- O feijão já cozido e tão tenrinho, as restantes carnes… um luxo. E as tripas? Ai as tripas!

Será melhor ser eu a explicar o imbróglio. Até porque, na verdade, nem o Sr. Andrade nem o Joaquim estão capazes de o fazer.

Coube ao Joaquim, como habitualmente, a tarefa de ir buscar as tripas. E lá foi muito satisfeito por poder arejar.

O talho fica ali para os lados do Largo de S. Domingos, bem perto da Ribeira, local onde vive o Joaquim. Já na posse do saco das tripas não resistiu e foi dar uns toques na bola com alguns dos seus amigos que, supostamente fora do horário lectivo, por ali andavam a treinar para Ronaldo. Pousou as tripas em cima de um pilar e toca a dar na bola como se não houvesse amanhã. Tinha jeito o ganapo. E, mesmo quando estava em pleno Estádio do Dragão pronto a mandar um limpinho, sem resposta, ao guarda-redes do Benfica (Roberto nem ia perceber o que lhe tinha acontecido, como habitualmente, aliás…) é interrompido por uma cacofonia de latidos rosnidos e ganidos… E, quando olhou, ainda vislumbrou as tripas a escorregar pelo saco e uma matilha de cães a disputá-las… Foi aí que também as suas quase cederam tal foi o medo da reacção do Chefe Andrade, homem habitualmente calmo, é certo, mas capaz de actos imprevisíveis quando fora de si.

Lá ganhou coragem (foi necessário muita…) e regressou à cozinha onde tudo se passou como descrevi depois de o Joaquim entrar e, quase da porta declarar:

- Bom, chefe… Ah… Uh… Ah… Hoje não há tripas no Rivoli!!!!! Dei-as aos cães…


Este texto foi escrito para um "Clube de Escritores" que não chegou a realizar-se. O mote tinha de ser este. Não fui eu, obviamente, que escolhi...

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Sessão de autógrafos


Pois bem, é já amanhã.

Estarei a partir das 17 h no stand do Clube Literário do Porto para dar autógrafos e conversar com os amigos que queiram estar comigo.

Ah, é verdade, há uns miminhos...

Apareçam. É o stand com os autores mais supermaravilhosos. Digo-vos eu que sou absolutamente isenta...

Senão vejamos. Comigo
irão estar, pelo menos, a Maria Sofia Magalhães e o Albino Santos.


Quando terminarmos seremos rendidos pelo Danyel Guerra.

Querem melhor???
Impossível.

"Bordar a Vida" 2ª Edição

Como tenho andado distraída!!!!

E logo uma notícia tão importante!
Valham-me lá os santinhos mais adequados à situação. É que nem parece meu, perder uma oportunidade de me exibir!!!
Bom, mais vale tarde do que nunca.

Ora aqui vai. Esgotou a 1ª Edição do "Bordar a Vida", este:


já está na minha posse a 2ª Edição. Tão lindinho, não é???? Estou muito babada de orgulho.

quarta-feira, 1 de junho de 2011


No dia que lhes dedicamos (não deveriam ser todos?) aqui vai um texto que nos revela como são MARAVILHOSAS as CRIANÇAS.

Ei-las a dissertar sobre as Avós...


Uma avó é uma mulher que não tem filhos; por isso gosta dos filhos dos outros.

As avós não têm nada que fazer, é só estarem ali.

Quando nos levam a passear, andam devagar e não pisam as folhas bonitas nem as lagartas.

Nunca dizem: despacha-te. Normalmente são gordas, mas mesmo assim conseguem atar-nos os sapatos.

Sabem sempre que a gente quer mais uma fatia de bolo, ou uma fatia maior.

Uma avó de verdade nunca bate numa criança; zanga-se, mas a rir.

As avós usam óculos e às vezes até conseguem tirar os dentes.

Quando nos lêem histórias nunca saltam bocados e não se importam de contar a mesma história várias vezes.

As avós são as únicas pessoas grandes que têm sempre tempo.

Não são tão fracas como elas dizem, apesar de morrerem mais vezes do que nós.

Toda a gente deve fazer o possível por ter uma avó, sobretudo se não tiver televisão.


(in "Enfants de Partout" - Composição de crianças de 8 anos - Genebra)

sábado, 21 de maio de 2011

E o tempo…

("A desintegração da persistência da memória", óleo sobre tela, Salvador Dali, museu de S. Peterburgo)

E os dias que teimam em passar

numa sucessão imparável de frias madrugadas.

E o tempo que teima em não parar

e me deixa as sobras desses dias

os cheiros, os sabores acres dessas azuis alvoradas.

E os dias e as noites e o tempo

e as alvoradas e o tempo que não se deixa agarrar…

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Para que a memória nunca se apague...

“As Duas Sombras do Rio” de João Paulo Borges Coelho

Foi o primeiro livro que li deste autor moçambicano. Já tinha ouvido o seu nome ligado a um prémio literário, prémio Leya, julgo eu, e, talvez por isso, tenha tido curiosidade em o ler.

Pois bem, encontrei um livro muito bem escrito e interessante na história que conta. Mais propriamente no intrincado de várias histórias de várias pessoas pertencentes a populações residentes nas margens desse majestoso rio que é o Zambeze no local em que o Aruângua com ele conflui. Aí mesmo onde ele irrompe por Moçambique dividindo um norte mais feminino, mais sábio, ligado à serpente de um sul mais masculino, mais fogoso, ligado ao leão.

E tudo começa no dia em que Leónidas Mtsato é encontrado desmaiado porque, segundo os curandeiros nele se trava uma luta entre estes dois espíritos. Nele que tem nome de leão e apelido de serpente.

A partir daí as histórias vão-se sucedendo num intrincado que não obedece nem a hierarquias de tempo nem de espaço, nem sempre muito perceptível a meu ver.

Vamos passando pela guerra civil tendo as perspectivas de todos os intervenientes; pela vivência quotidiana destas populações pobres e o seu relacionamento com os dois países muito juntos de si, a Zâmbia e o Zimbabué; pelas suas crenças e a forma como estão ligadas por um lado à natureza por outro a um mundo mágico muito próprio.

Bom, não posso dizer que não tenha achado um livro agradável e que não o tenha lido com agrado. Contudo não encontrei nele o suficiente para o considerar um grande livro. A verdade é que não provocou em mim aquele entusiasmo!

domingo, 10 de abril de 2011

Quando ainda sorrias porque sim

"Moça com gato" de Lilian Zapol

Consegues ainda lembrar-te
de quando a vida não era apenas uma guerra constante
e os dias uma sucessão de imensas batalhas
que sentes ter de ganhar a todo custo
por mais insignificantes que sejam?

Consegues ainda lembrar-te
de como era tão mais importante uma conversa mansa,
o assomar de um sorriso, do que a constatação de uma razão?

Consegues ainda lembrar-te
de como a troco de tão pouco me fazias rir sem parar?

Eu, eu consigo ainda lembrar-me
de olhar para o teu rosto, para o teu sorriso aberto
e sentir que, para mim, ali, se encontrava o mundo…

terça-feira, 5 de abril de 2011

“O Gato e o Rato” de Gunter Grass

Foi o terceiro livro que li deste autor e, seguramente, foi também aquele que menos me entusiasmou.

Tal como os outros, também este fala no passado. Também este refere os sinais da guerra, os couraçados, os aviões, os submarinos. Talvez seja a forma de o autor o expiar (ao passado, caso tenha algo a purgar).

Dentro do seu magnífico estilo de escrita que balança entre o pragmático mais absoluto e o incontestável poético, o autor conta-nos uma parte da sua infância, enquanto estudante, na sua terra natal; a Danzing dos tempos da guerra.

Mas conta-nos sobretudo a vida de um amigo seu Mahlke que, senhor de uma série de aspectos anatómicos e outros, deveras incomuns, o tornam uma figura à parte. Admirado por uns e repudiado por outros, luta para se entrosar socialmente com os seus colegas de turma.

Os anos vão passando e este ser à margem é amado, admirado, estranhado, invejado até por uma série de idiossincrasias que fazem dele uma pessoa diferente; a sua maçã-de-adão exageradamente proeminente, a sua relação com a religião sobretudo com a Virgem, a sua eterna chave de parafusos ao pescoço…

E é nessa luta diária de Mahlke e nos seus sucessos e insucessos que podemos encontrar também uma semi-velada crítica social à Alemanha da guerra.

Enfim, Mahlke ganha a admiração dos colegas mas será mesmo uma vitória?

Como disse não me entusiasmou de sobremaneira mas, dada a qualidade literária que possui, considero um livro a ler.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Noite de Poemia


Assisti ontem, mais uma vez, a uma das já habituais noites de Poemia no Labirintho.

A esta não poderia faltar pois destinava-se a homenagear o poeta, crítico e dinamizador da poesia enquanto espectáculo aqui no Porto e em alguns outros locais, Joaquim Castro Caldas. Um diseur impressionante e um não menos impressionante escritor que, na cave do “Pinguím” todas as segundas feiras, ajudou a tornar a poesia uma arte de ver e de ouvir, de mastigar de abraçar e não apenas um montículo de letras agrupadinhas num qualquer livro ou folha, ou guardanapo….

Ontem, reuniu-se um bonito grupo de amigos, conhecidos, frequentadores das célebres noites de Pinguím e, num ambiente descontraído sem bem que emotivo, foram contando episódios passados com Castro Caldas e dizendo textos seus bem como outros que ele tanto gostava de dizer e com que encantou quem o ouvia.

Realço aqui as intervenções de João Habitualmente, amigo próximo de Castro Caldas, de Rui Spranger a quem se deve a continuidade das sessões de poesia no Pinguím. E, com muita pena minha não recordo os nomes dos outros (tantos) amigos que tão bem lhe prestaram culto. Aqui ficam as minhas desculpas.

A abertura da sessão com a devida apresentação da vida e obra do homenageado esteve a cargo de Danyel Guerra que muito bem o conheceu e com ele conviveu.

Uma excelente sessão.



quarta-feira, 23 de março de 2011

“A Casa de Papel” de Carlos María Domínguez

Li “de um só fôlego”, como me avisava a badana da contracapa, este pequeno/grande livro deste autor argentino que não conhecia. E, mais uma vez, fiquei com aquela incómoda mas ao mesmo tempo doce sensação de ter sabido a pouco… de querer mais…

A este livro só lhe falta ser um bom bocado mais “gordinho” para retratar um pouco de mim. É que nos fala, de forma deliciosa, do amor pelos livros. Da compulsão pela leitura mas também pela posse do objecto livro.

E como eu gosto dele; de o manusear, de o abrir, de lhe “medir” as margens, de o cheirar, de lhe cobiçar as letras…

Vai-nos levando através desta magnífica fábula (ou como lhe queiram chamar) através dos comportamentos daqueles que amam os livros.

É uma reflexão belíssima sobre a arte de os usar, de os estudar, de os possuir, de os guardar, de os preservar, de os ler, de os amar. Reflecte também, ou leva-nos a reflectir, acerca de até onde o amor desmesurado pelo livro nos pode levar; o quão difícil é saber quando parar, qual é a linha limite a partir da qual o comportamento pode ser considerado doentio, irracional, patológico.

Tudo começa com a morte de Bluma Lennon, atropelada por um automóvel, quando seguia lendo um velho exemplar dos “Poemas” de Emily Dickinson que acabara de comprar no Soho.

Alguns dias mais tarde, o seu substituto no Departamento de Línguas Hispânicas da Universidade de Cambridge recebe no deu gabinete um embrulho, proveniente do Uruguai, dirigido à sua defunta colega.

Quando o abre depara-se com um volume sujíssimo, com pedaços de cimento e terra agarrados o qual tem dificuldade em reconhecer como sendo um exemplar de “A Linha da Sombra” de Joseph Conrad, autor acerca de quem a sua colega estava a preparar uma tese.

E a partir daqui, meus amigos, irão vocês entrar no percurso fabuloso que eu já fiz e que, naturalmente, irei voltar a degustar.

terça-feira, 22 de março de 2011

Tão loura e fria…



Tão loura e fria…

Faziam versos "como quem morre" e a sua principal, ou única, fonte de inspiração foi a morte e a doença que os vitimou entre os 20 e os 30 anos de vida, na última metade do século XIX, deixando-nos os seus lamentos em forma de poemas que suscitam a nossa compaixão e o nosso espanto.

No Dia Mundial da Tuberculose lembramos estes poetas, numa justa homenagem. Merecem que lhes dediquemos um olhar terno e fraterno porque o seu destino seguiu o enunciado de Horácio, Paluto, Pessoa: "Morrem jovens os que os deuses amam"

Será numa sessão de poesia no próximo dia 24/3/11, no Café Progresso (ao Largo Moinho de Vento, Porto), pelas 21,30, apresentada pelo ilustre pneumologista Dr. António Ramalho de Almeida, autor de um trabalho notável de esclarecimento e luta contra esta doença que continua a matar sem piedade.
Serão lidos poemas por Celeste Pereira, com projecção de imagens e fundo de tango argentino, o som trágico e dolorido como a paixão e a morte que acompanharam Júlio Dinis, Soares de Passos, António Nobre, António Aleixo, José Duro, e tantos outros.

Mais uma vez encontramo-nos pela poesia e com a poesia!

“O Sonho do Celta” de Mário Vargas Llosa

Acabei de ler o livro referido o qual havia comprado com alguma curiosidade. Em primeiro lugar por ser de um autor que aprecio e depois por contar a vida de Roger Casement, um personagem totalmente desconhecido para mim mas, cuja envolvência na causa irlandesa (em relação à qual também padeço de uma enorme dose de ignorância, confesso), me fez aguçar o interesse.

E o livro é isso mesmo. Uma biografia exaustiva, romanceada, é certo, mas biografia mesmo assim, do irlandês Roger Casement.

Os episódios da sua vida aventureira vão intercalando com os seus pesadelos na prisão. Todos são memórias…

Este homem que teve uma vida prodigiosa, plena de aventuras e perigos, acérrimo defensor dos direitos humanos, foi cônsul inglês no Congo Belga.

Aí, numa viagem longa e aventurosa pelo rio Congo presenciou as atrocidades cometidas sobre os indígenas sobretudo no que diz respeito à exploração da borracha praticadas sob o beneplácito do governo de Leopoldo II.

Denunciou-as num longo relatório que lhe granjeou respeito na Europa.

Mais tarde, veio a denunciar os mesmos delitos cometidos agora na Amazónia peruana. Aqui correu graves riscos quer por causa das peripécias da própria viagem, já por si arriscada, quer por causa das represálias de quase todos pois todos mesmo beneficiavam com a exploração da borracha à custa dos maus tratos dos índios peruanos.

Mais uma vez os seus relatórios tiveram um enorme impacto e fortes consequências se bem que não as que ele previa…

No final da sua vida tornou-se um defensor do nacionalismo irlandês cuja dependência perante os ingleses comparava ao colonialismo que tão bem conhecia.

Assim, assume a estratégia de se aliar aos alemães no início da 1ª guerra mundial com a expectativa de que estes fossem uma ajuda à independência da Irlanda.

Esta associação funesta, ingénua e imprudente teve como consequência a sua prisão, julgamento e condenação à morte como traidor à pátria.

Para denegrir a sua imagem muito contribuíram os seus diários pessoais que, divulgados ainda em vida deste, na prisão, enquanto aguardava a comutação da pena, revelavam a sua faceta de homossexual atrevido e despudorado. Julga-se que alguns desses relatos não passassem de efabulações, fantasias de algo que ele gostaria de ter vivenciado.

Enfim, um livro interessante pelo conhecimento que nos dá de uma personalidade incomum e que, apenas de há muito pouco tempo a esta parte tem vindo a ser reabilitado e reconhecido como uma pedra importante na luta pela independência da Irlanda.

Interessante, sem dúvida, mas não dos meus preferidos de Mario Vargas Llosa.

domingo, 20 de março de 2011

A Poetria

Porque a Poetria É.

Porque é uma realidade inegável para todos quantos lêem e gostam de ouvir boa poesia, achei por bem colocar este comunicado que a própria Poetria me enviou por mail e cujo conteúdo me deixou deveras irritada pela sua injustiça:


QUEM TEM MEDO DA POETRIA?

Na sua última edição de Março, a revista “Os meus livros”

publica um dossier intitulado “A resistência da poesia”, assinado por Andreia Brites, mencionando editoras e livrarias que, contra ventos e marés, continuam a apostar na Poesia como género literário bem presente no mercado.


Até aqui nada a assinalar. Trabalho louvável de pesquisa e desenvolvimento no sentido da divulgação da poesia. E não fora o “esquecimento” da Livraria Poetria entre as que referiu no seu artigo, a abordagem seria perfeita.


Mas Andreia Brites omitiu esse pequeno grande pormenor: A livraria que pela 1ª VEZ ousou instalar-se no mercado SÓ com livros de Poesia (e Teatro), e que no mercado PERMANECE desde 2003 foi, sim, a Livraria Poetria.


(Já em tempos, num importante artigo na Pública assinado por Luís Miguel Queirós sobre esse tema e os locais onde se vendem livros de poesia, a Poetria não foi incluída no conjunto das livrarias citadas)


Já agora, quando em 2008 abriu em Lisboa uma livraria de poesia, foi comentado na comunicação social e outros sítios que acabava de surgir “a 1ª livraria de poesia no país”.


E ainda, outro pormenor no mínimo insólito, a Livraria Poetria também NÃO é referida, nem ao de leve, na esmagadora maioria dos blogs ou sites especializados ou que falam de poesia (com honrosas excepções como a Assírio e Alvim, o Bibliotecário de Babel ou o Eu ela e a escrita…).


É caso para perguntar: Quem tem medo da Poetria?


OUÇAM TODOS (os que teimam em nos ignorar): a Poetria existe e resiste apesar de tanta indiferença, na sua senda poética de divulgação da “linguagem das aves”. E até vamos em breve alargar o nosso espaço físico para que mais livros de poesia (e teatro) possam aqui morar.


E como não tem inveja de ninguém, insere no seu site (www.livrariapoetria.com
) muitos links para blogs, sites e nomes ligados à poesia. Vão lá e verifiquem com os vossos próprios olhos, seus distraídos.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Poietikós - A Poesia da Vida


Atenção, estive nos ensaios, não percam.... A sério, não percam mesmo!!!!


A convite da Câmara Muncipal de Gondomar, a edita-me vai levar a cabo o espectáculo

Poietikós - A Poesia da Vida

dia 18/Março, pelas 21h30, no auditório da Biblioteca Municipal de Gondomar.



A vida, as pessoas, os poetas enquanto seres humanos, que se cruzam, que se apaixonam, que escrevem o que vivem e que vivem escrevendo...



Um espectáculo construído exclusivamente a partir de textos já publicados de autores da edita-me, que estarão presentes para no final, interagirem com o público.



Com as participações:
- Leituras por Ana Afonso, Carlos Lopes e Celeste Pereira
- Dança (ballet) por Filipa Lopes e Inês Magalhães
- Musical 575 Band e Ângela Cintra

Entrada livre!