Sou uma pessoa pragmática e defensora da lógica e do explicável. Contudo, acredito que de algum modo fiquei presa, através de algum vínculo indelével, ao local onde nasci e onde passei uma parte da minha infância. É algo que não entendo bem, que não explico bem mas que me proporcionou alguns dos momentos mais agradáveis, se bem que mais estranhos, que vivi. Passaram-se anos e mais anos sem que lá tenha voltado; passaram-se anos e mais anos sem que tomasse consciência da sua memória e, apesar disso, no dia em que lá voltei, senti algo inexplicavelmente mágico.
Senti um conforto que subrepticiamente se ia encostando à minha pele; uma brisa que me soprava na memória, um calor bom que me dilatava o peito, uma inquietude de quem não quer perder nada...
E quão fortes e ,ainda assim indefiniveis, foram as sensações ao descobrir (agora tão pequeninas) as poldras por onde atravessava, cheia de medo, o rio; ao sentir sob os meus pés as pedras muito polidas da velha ponte romana (da pequenina) que eu tantas vezes calquei em menina; ao relembrar o sabor e a temperatura da água das caldas; ao rever, agora com outros olhos, a orgulhosa Torre de Menagem e a muralha; ao descobrir as portadas verdes das janelas da primeira casa (a do Postigo) de que tenho recordações; ao eapreitar a janela por trás da qual, num tempo já muito antigo, eu sabia que o meu pai estava a trabalhar; ao passar na igreja onde (ainda) todos os Domingos a família ia à missa; ao atravessar a ponte de Trajano em direcção ao “Jardim Público”, o das verbenas nas quentes noites de Verão; ao descer a Rua Direita; ao sentar-me na esplanada da Pastelaria (agora croissanteria) Aurora; ao rever a escola onde aprendi a gostar das letras; ao sentir os odores da minha infância....
De repente, inexplicavelmente, dei por mim a sentir que fazia parte de tudo isto, a sentir que tudo o que me rodeava era muito mais “eu” do qualquer outro local onde tenha estado, a sentir que, finalmente, tinha regressado a casa!
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