Foi-me dada a honra de dizer os poemas inseridos na apresentação do livro de Nuno Dempster “Dispersão Poesia Reunida”.
Tive o privilégio de ter o livro em casa com bastante antecedência pois também me cumpria a escolha de alguns e, devo dizer, que foi uma agradabilíssima surpresa.
Não conhecia o autor, tendo-me sido apresentado apenas no momento do lançamento. Sabia, contudo, que se tratava de uma pessoa já não muito jovem.
Porém, à medida que me ia embrenhando na leitura dos seus poemas, acompanhando, de certa forma um percurso de vida, encontrei no seu registo uma juventude e uma modernidade, algo surpreendentes, muito interessantes e muito apelativas.
Um livro que, para quem gosta de poesia, será um agrado ler.
A apresentação foi no Café Guarany, sobejamente conhecido na Invicta pela sua ligação a eventos culturais e artísticos de diversas áreas realçando contudo as tertúlias poéticas que movimentam diversos nomes conhecidos do nosso universo literário.
Um pequeno senão. Sendo um espaço público é muito difícil criar-se um ambiente de algum silêncio, propício à compreensão dos poemas. Os leitores foram obrigados a um esforço adicional, o de se sobreporem ao burburinho normal de um café grande e, pelo menos eu, fiquei com a sensação que um pouco se perdeu daquilo que sei que poderia ter transmitido.
Esteve muitíssimo bem Carlos Andrade e a sua viola que nos encantou com belíssimas canções com poemas, também eles fantásticos, de poetas consagrados, interpretados de forma simples mas nem por isso menos grandiosa, na sua voz doce e envolvente.
Deixo-vos agora com um dos poemas que disse apenas para vos aguçar o apetite. O livro está à venda na livraria do costume; na Poetria, claro.
CHRISTIAN BOLTANSKI
(Sobre Humans, instalação, 1994
no Museu Guggenheim em Bilbau)
As pessoas não estão ali, são retratos
cujos corpos a morte deve ter levado,
a uns durante a guerra que os evoca,
a outros no fim do tempo de cada um,
restando o esquecimento que os envelhece.
Talvez seja a razão de as fotos serem
todas de tamanho igual, e Boltanski
as alinhe como campas suspensas na parede.
Os vivos caminham sem ruído, a olhar
em busca de algo que seja luz,
entre lâmpadas votivas como velas
e nesse recanto de três muros não há luz
senão a de existir e desnudar
a ausência que os olhos acentuam.
É um réquiem sem nada a que aspire.
Nem o amor vale ao destino
de se ter nascido como aquela gente.
Nem os beijos que se buscam,
ou os corpos que se dão para serem num.
Não há nada que redima.
Um menino diz: meu nome é Peter,
morri no bombardeamento de Aschaffenburg.
Outro é Bulie e chama Roswitha!
e a irmã não responde, nem ouve.
Há amor também, desejo, risos, mais crianças.
Tudo no entanto é vão e contrário
do que se mostra entre as lâmpadas
em vigília e fotos de soldados nazis
como um sinal de morte, misturadas
às de cadáveres de onde se esvai o sangue
e á de mulher violada de cujo rosto,
num cair de pálpebras, nasceu a libertação.
É um deserto este recanto do museu,
uma capela de silêncio há muito encerrada.
Ou que nunca se abriu.
Boltanski chamou-lhe Humans.
10 comentários:
Concordo. Gosto do poema.
Este é apenas um de muitos. Este eu disse...
É uma parte que faz ter vontade de ler o todo. Devagarinho, um de vez em quando, para digerir e aprender. Isto da poesia é muito estranho para mim. Aliás, tudo na línguagem escrita é muito estranho para mim. Um mundo de segredos que vou acompanhando, simplesmente, com a minha intuição.
E é o fundamental, a intuição e a sensibilidade.
Talvez. Mas depois vem o insaciável (des)conhecimento. Quer-se mais...
E vai-se adquirindo...
Alguns amigos (as) vão ajudado!
:)
Este Humans esta Marcante , nao é possivel ficar indiferente ao que se lê !...
Tembém eu caminho à procura da minha Luz !...
Gostei imenso , Obrigado .
Beijo
Gostei da poesia e sendo lida com alma e uma grande interpretação ela cresce aos nossos ouvidos, não?
Imagino que vc viva a poesia, e coloque em sua fala, toda emoção necessária e deixando bem claro todos os sentimentos que estão por trás de todas as palavras.
Tenho 02 mimos para vc em meu blog.
Um bj grande daqui...
Wal.
Claro Wall. Quando leio poesia o meu objectivo é mesmo o de interpretar (ou pelo menos tentar), o sentimento e a emoção que o autor nos quer transmitir...
E este poema, quando bem interpretado, abala-nos.
Homem de Ferro. Para si, um destes dias postarei um que, se calhar, se lhe adequa que nem uma luva...
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