Hoje, enquanto aguardava que chegassem os meus habituais companheiros de almoço e como estava bastante desgostosa e com pouca vontade de explicar os motivos, refugiei-me na leitura de um pequeno livro que comprei por ter ganho o “Prémio Nacional de Conto Manuel da Fonseca”, da autoria de Maria Isabel Moura.
É um livro mesmo pequenino (cerca de 45 páginas) e nem todas escritas, composto por 20 pequenos textos, excepcionalmente bem escritos.
Foi, sem dúvida, uma agradabilíssima surpresa.
Esses textos têm um denominador comum, o tema, que é “afogar gatos na sanita”. Devo dizer que, como tema, foi o pior que poderia ter escolhido para hoje dia em que encontrei morta a minha gata, companheira de dez anos, a Fiona.
Mas voltemos ao livro que é a razão desta minha prosa.
Esses vinte textos, todos contando situações diferentes, com o mesmo denominador, como já referi, compõem um verdadeiro bouquet literário.
É o tipo de escrita que é cuidado, apelativo, elegante indo do timbre poético, suave, encantador até nos abanar com linguagem despudorada, dura e crua sem perder, contudo a poesia.
Uma verdadeira joiazinha perdida, quiçá, aí pelos cantinhos das livrarias.
(Imagem: "Depois da leitura dos poemas" de Sandro Chia)
E lá concluí a minha participação no lançamento do livro “A Minha Nuvem” que só não foi, para mim, a mais difícil porque essa foi, sem dúvida, a primeira, por razões várias, há já algum tempo.
Mas, também esta, teve contornos acrescidos de responsabilidade; pela minha grande crença na qualidade poética da autora, pela amizade pessoal que nos une, porque julgo ter sido a primeira pessoa a divulgar, através da voz, as palavras da Ruth e, sobretudo, porque gostaria de ajudar a tornar aquele dia (um dia de sonho para qualquer autor), um dia verdadeiramente mágico e que ficasse gravado na Nuvem, em letras de ouro, para sempre.
Penso que consegui fazer o que me era devido. Logo que entrei no Bela Cruz atirei com a ansiedade para o “Peixanário”, logo ali ao lado (foi a banhos), ergui os ombros (nus!!!!) e quedei-me, eu mesma, cheia de vontade de dar voz aos lindos poemas que me couberam dizer.
E dei. Demos, eu e a Olga que esteve primorosa! Podíamos não ter dado. Mas demos.
Foi uma belíssima apresentação. Esteve tudo cuidado até ao ínfimo pormenor. Tinham-se corrigido pequenos senãos sentidos numa sessão anterior e, apesar da luta contra o tempo, A está verdadeiramente de parabéns.
Tiro o chapéu à sua capacidade de organização sobretudo na pessoa do Carlos que tudo fez para que o evento fosse realmente distinto.
E foi. Podia não ter sido. Mas foi.
Agora a música. Uma maravilha! A voz melodiosa do Miguel tão bem acompanhada pelo piano, bateria e baixo, julgo que convenceu todos quantos lá estavam.
Um agradecimento muito especial para o teclista que além de tocar as músicas dos temas que apresentava com a banda, ainda teve de nos aturar em “treinos” para decidir a melhor forma de acompanhar os poemas que iriam ser ditos. É um rapaz cobertinho de paciência, tanto quanto de talento…
Podia não ser. Mas é.
And last, but not the least, a autora!
Pois, A Ruth estava LINDA! Pois não é que “o raça da piquena” além de se dar muito bem com a manipulação de tudo o que são letrinhas, palavras lindas que compõe em frases melódicas com uma naturalidade que torna tudo, enganosamente, fácil… Ainda por cima é deslumbrante?!!!!
Esteve muito bem, muito emocionada mas muito contida, fartou-se de dar autógrafos e de escrever dedicatórias (as quais, espantem-se, não necessitam de tradutor) e falou, como sempre, bem.
Parabéns Ruth.
Se tudo correu bem, não tenhamos ilusões, tudo começou pelo mérito das suas palavras.
De mim, aquele Beijo, meloso, besuntado e com um pelito à mistura (não fosse eu gata) que já conhece.
Como habitualmente (e podia ter vergonha ao dizer estas coisas, mas não tenho), o meu gatão foi preparar-me o pequeno-almoço e trouxe-mo à cama onde ainda me encontrava, a transbordar de preguiça e a ler displicentemente umas paginazinhas de um livro, rodeada de três gatinhos…
Sentou-se ao meu lado, também na cama e começamos a tomar o pequeno-almoço falando disto e daquilo mas, sobretudo, de coisa nenhuma pois, normalmente, antes do café, funciono um pouco mal. Diria mesmo que nem funciono. Consigo ser bastante irritante.
A dada altura reparo que ele abanava ligeiramente a chávena (mas com muito estilo, pegando na asa com dois elegantes dedos) fazendo voltear repetidamente o café.
Algo surpreendida e entontecida ainda pela falta do meu e dado que nenhum de nós coloca açúcar ou outro adoçante, olhei para ele com ar de quem o ia internar logo a seguir e pergunto:
- Porque estás a rodar a chávena do café antes de o tomar?
- Para o arrefecer. Responde-me ele com muita calma.
- E ele está assim quente? Retruco eu ainda com ar de estranheza.
- Não.
- !!!!!????? Então porque rodas? É para ver se o entornas????
- Não! É porque gosto.
Olho para ele e, de repente, tive uma imensa vontade de rodar o meu. Pego na chávena…
- Ei! Não consigo! Deixa cá ver. Não consigo mesmo. Ups! Roda tudo torto. Ainda vou sujar a cama toda…
- Pois – responde-me ele - isso não é assim! É preciso jeito, cálculos precisos… Enfim, ir aos treinos!
- Ah!!!
- Eu comecei a rodar cafés, ainda….
Foi aí que eu não aguentei e despenquei à gargalhada! Tinha finalmente compreendido a parvoíce de conversa que estávamos a desenvolver com todo o rigor.
Claro que as minhas gargalhadas despoletaram as dele e foi de ir às lágrimas.
Presumo que quem ler isto não é pessoa para lhe acontecerem tais disparates. Nem para ter conversas deste tipo e, pior do que isso, desatar a rir, como se não houvesse amanhã, de coisa nenhuma. Mas, caríssimos, comigo é assim!
E desta forma soluçada e fungada terminámos com dificuldade, diga-se, o pequeno almoço de uma cinzentona manhã de Domingo.